terça-feira, 25 de maio de 2021

Exercício Físico e máscara facial

 



    Com o novo coronavírus (SARS-Cov-2), as máscaras se tornaram "populares" (obrigatórias), sendo uma das tentativas de reduzir o número de infecções. A meta-análise de Chu et al. (2020) fornece dados para crer que medidas como uso da máscara, distanciamento (ao menos 1m, sendo 2m mais seguro) e proteção ocular são eficazes ao reduzir o número de contágio.

    Porém o estudo sobre o uso da máscara ao realizar exercícios físicos precede essa triste realidade, ainda que antes, o principal objetivo fosse a melhora de desempenho, utilizando outro tipo de máscara facial, as quais simulam elevadas altitudes. Embora diferenças importantes ocorram entre esses tipos de estudos, alguns pontos em comum existem e merecem destaque.

    Fikenzer et al. (2020) evidenciaram que dois tipos de máscaras (cirúrgica e FFP/N95) reduziram significativamente o desempenho cardiorrespiratório (potência máxima, VO2máx, ventilação e desconforto geral) em teste incremental em uma bicicleta ergométrica, sendo os piores resultados apresentados na máscara FFP2/N95.

    Por outro lado, Epstein et al. (2020) não encontraram diferenças significativas no tempo até exaustão, pressão sanguínea sistólica, frequências cardíaca e respiratória, saturação de oxigênio e percepção de esforço nos 3 protocolos (sem máscara, com máscara cirúrgica e com máscara N95) realizados em bicicleta ergométrica. Embora ambos os estudos tenham sido aplicados em sujeitos saudáveis e ativos, a divergência nos resultados sugere que algumas pessoas podem se adaptar mais rápido ao uso da máscara em exercícios físicos.

    Embora os resultados de Fikenzer et al. (2020) possam parecer bastante prejudiciais ao desempenho físico, é importante lembrar que o uso da máscara pode ocasionar maior estresse metabólico, o que é interessante quando o objetivo é a hipertrofia muscular.


Conclusões

    Apesar do desconforto e possível redução do desempenho físico ao se exercitar com máscara, uma maior segurança e menor risco de contágio de infecções parece ser um pequeno preço a se pagar. Além disso, manter uma rotina de exercícios físicos é fundamental para obter os diversos benefícios do exercício físico, dentre eles o  fortalecimento do sistema imunológico e melhora em variáveis psicológicas (ex.: diminuição de sintomas depressivos e ansiedade).

    Dessa forma, o gerenciamento das variáveis agudas do treinamento devem ocorrer afim de tornar o treino efetivo, porém um pouco mais confortável ao praticante. Dentre as possíveis formas para isso, posso citar uma pequena diminuição na intensidade do exercício, ou um aumento no tempo de descanso. Além disso, se possível, é interessante levar mais que uma máscara e realizar a troca após grande quantidade de suor.

   

Referências

Teodoro, C. L. (2017). Efeito agudo do uso da máscara de restrição de fluxo de ar durante a realização de exercício resistido.


Fikenzer, S., Uhe, T., Lavall, D., Rudolph, U., Falz, R., Busse, M., ... & Laufs, U. (2020). Effects of surgical and FFP2/N95 face masks on cardiopulmonary exercise capacity. Clinical Research in Cardiology, 109(12), 1522-1530.


Epstein, D., Korytny, A., Isenberg, Y., Marcusohn, E., Zukermann, R., Bishop, B., ... & Miller, A. (2021). Return to training in the COVID‐19 era: The physiological effects of face masks during exercise. Scandinavian journal of medicine & science in sports, 31(1), 70-75.






segunda-feira, 3 de maio de 2021

Retorno aos exercícios físicos pós COVID-19

 



    Enquanto alguns lugares do mundo já se livraram da obrigatoriedade do uso da máscara de proteção individual, no Brasil, aparentemente ainda vivemos no ápice dessa triste doença. De acordo com o site oficial do governo, no dia 02 de maio, 13.278.718 pessoas se recuperaram da covid-19, enquanto o total de vacinados (ao menos 1 dose) acumula-se em 29.421.191.

    Ao considerarmos esses dados, assim como a iminência de tais números aumentarem nos próximos meses, a volta dessas pessoas às atividades cotidianas merece atenção, dentre elas o exercício físico. É de conhecimento popular que a prática regular de exercícios físicos proporciona diversos benefícios à saúde, podendo diminuir gravidade da infecção pelo novo coronavírus (SARS-Cov-2), bem como auxilia na recuperação de importantes atributos após a recuperação. Contudo, alguns cuidados merecem ser tomados ao planejar tal volta aos exercícios físicos.

    Este post é baseado no artigo de Salman et al., publicado em 8 de janeiro de 2021, apresentando um ponto de vista prático sobre o retorno aos exercícios físicos pós COVID-19.


Riscos do exercício físico pós covid-19

    Os riscos após recuperar-se da covid-19 irão depender de como se desenvolveu essa doença e qual sua gravidade, podendo ser diferente em cada indivíduo. Além disso, dado que é uma doença recente, existem poucos estudos que avaliem uma maior amplitude de fatores em pessoas recuperadas. Aqui serão abordadas algumas complicações que merecem uma maior atenção.

    A primeira delas é identificar o risco para miocardite viral. Trata-se de uma inflamação no músculo cardíaco conhecido como "miocárdio", podendo ser ocasionada principalmente por  vírus, bactérias, protozoários ou fungos, medicamentos, doenças auto-imunes, consumo exagerado de álcool e outras drogas. Tal inflamação pode ocasionar uma maior dificuldade no bombeamento do sangue e arritmias cardíacas, afetando diretamente o desempenho em exercícios físicos e a saúde do indivíduo.

    Outro fator é avaliar qual impacto da covid-19 nas funções respiratórias, as quais são uma das mais afetadas por essa doença. Complicações como embolia pulmonar e insuficiência respiratória estão associadas com a covid-19, as quais influenciam o desempenho em exercícios físicos, em especial os cardiorrespiratórios (como o ciclismo e a caminhada).

    Além disso, é importante saber como está o estado psicológico dos indivíduos recuperados, uma vez que estresse pós-traumático, altos níveis de ansiedade, sintomas depressivos e psicose têm sido identificados em indivíduos após a covid-19, o que merece bastante atenção a fim de reduzir tais sintomas, bem como auxiliar na escolha do local e modalidade mais indicados para a prática do exercício físico. 


Como retornar aos exercícios físicos com segurança?

    É aconselhado que o retorno ocorra apenas após um período de cerca de 1 semana sem sintomas da covid-19, iniciando com esforços leves e progredindo de forma lenta e gradual, respeitando os princípios do treinamento físico e tendo atenção em relação à forma como o indivíduo está reagindo aos exercícios físicos.

    Salman et al. (2021) propuseram 5 fases para auxiliar no retorno aos exercícios físicos, as quais devem durar ao menos 1 semana, podendo regredir de fase caso o indivíduo tenha dificuldades na sua realização. Além disso, a progressão de fase só deve ocorrer quando o indivíduo puder cumprir a meta de cada fase.


Fase 1

    - Meta: preparação para o retorno aos exercícios físicos

    - Exercício: repouso, exercícios de respiração, flexibilidade/alongamento, equilíbrio e caminhada leve

    - Percepção subjetiva do esforço (PSE) sugerida*: 6 - 8 (extremamente leve)


Fase 2

    - Meta: atividades de baixa intensidade como caminhada, yoga (leve) e tarefas domésticas

    - Exercício: aumento gradual de 10 - 15min por dia

    - PSE sugerida: 6 - 11 (muito leve - leve)

    - Progressão: quando puder caminhar 30min com PSE 11 (leve)


Fase 3

    - Meta: desafios cardiorrespiratório e força de intensidade moderada

    - Exercício: como exemplo, pode conter 2 séries de 5min em exercícios cardiorrespiratórios, com 5min de descanso entre eles. Se possível, adicionar 1 série a cada dia.

    - PSE sugerida: 12 - 14 (leve - moderado)

    - Progressão: quando realizar uma sessão de 30min e se sentir recuperado após 1h


Fase 4

    - Meta: desafios cardiorrespiratório e força de intensidade moderada com exercícios funcionais e de coordenação

    - Exercício: intercalar 2 dias de treino com 1 dia de recuperação

    - PSE sugerida: 12 - 14 (leve - moderado)

    - Progressão: quando os níveis de fadiga estiverem normais**


Fase 5

    - Meta: exercício regular

    - Exercício: retorno às atividades regulares

    - PSE sugerida: > 15 se tolerado


* Com base na escala de Borg de 6 - 20.

** Se possível, em comparação com antes da covid-19.


Referência

<https://covid.saude.gov.br>, acessado em 03 de maio de 2021, às 12:20;


Epstein, D., Korytny, A., Isenberg, Y., Marcusohn, E., Zukermann, R., Bishop, B., ... & Miller, A. (2021). Return to training in the COVID‐19 era: The physiological effects of face masks during exercise. Scandinavian journal of medicine & science in sports, 31(1), 70-75.


da Silva Ferreira, M., Farias, G. S., Barros, G. R., da Silva Santos, S. F., & de Sousa, T. F. (2020). Ponto de vista dos profissionais de Educação Física sobre o uso da máscara facial durante o exercício físico na pandemia da COVID-19. Revista Brasileira de Atividade Física & Saúde, 25, 1-9.


Salman, D., Vishnubala, D., Le Feuvre, P., Beaney, T., Korgaonkar, J., Majeed, A., & McGregor, A. H. (2021). Returning to physical activity after covid-19. bmj, 372.